Clara passeava no jardim e tudo era igual ao redor dela: todo dia o mesmo sol, os mesmos passarinhos cantantes, a mesma ironia de viver. Clara reclamava da vida como um cão que reclama seu osso; pensava que tinha direito a mais do que esta a regalava. Não, mais, achava que nada tinha vindo de presente mesmo, então a petição lhe era certa por mérito. Por toda sua vivência atormentara-lhe um sentimento infindo de que aquele corpo que passeava no jardim, aquela voz que saía de uma boca conhecida não era condizente. E tudo o que fizera fora para tentar ser condizente. E nada, até ali, havia adiantado muito: estava no mesmo lugar, não estava? E Clara repetia mentalmente seus desejos, como um mantra capaz de lhe trazer a mudança... o que ela não imaginava é que naquela manhã, quando tombou sobre um arbusto, num acesso lancinante de dor, tudo ainda continuava igual; a única coisa que mudara foi sua pergunta: como me deixei chegar a este ponto?
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5 comentários:
hehehe, belíssimo... principalmente com a narração mental que proporcionei ao teu texto, na tonante voz de Zé Wilker...rs...fiquei com dó de Clara, e logo fiquei com dó de mim, talvez porque também me dou o direito da alienação, e berro qdo meu desejo me faz tropeçar no asfalto esburacado do Real... fiquei com dó de Clara, porque acredito que seja assim que doa, quando nascemos como sujeitos.
Nem sempre a dor física leva à realidade. Dependendo da situação, leva à revolta, pois quando se pede um presente melhor e se recebe apenas uma dor pra dizer: "olha como tudo tava bem", mas não algo pra dizer: "Você merece algo melhor!!!" A pessoa entra na reflexão de o quanto ela é (ou não é) importante pro resto do universo...
Suicidalmente,
Doidus...
Mas a dor não precisa ser necessariamente física; ainda assim, seja ou não ela física, o problema está que não somos, mesmo, tão impostantes para os outros... pelo menos não na medida que achamos que poderíamos. E aí está a queda.
Talvez o fato de sermos impostantes, mascarados em uma redoma de que servimos pra algo, é que tira nossa importância e originalidade, questionamentos, etc. Precisamos ser mais elétricos!
Ou, talvez, o que nos é imposto e que não vai de encontro ao que desejamos seja o que tira nossa autenticidade... e, ainda, não somos impostantes para o outro pelo fato de cada um estar em vistas à sua própria bem-vivência, ainda que isso esteja sempre sempre mascarado, o que retorna mais uma vez ao meu lapso de escrita. Mas, ao fim de tudo isso, queria retificar que não somos tão importantes para o outro, por isso e por tantos outros motivos.
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