15 de jun. de 2010

O possível de uma relação inexistente

Falar, para além de uma função organizadora, tem uma função social. Nunca entendi direito porque eu não me dava muito bem no social; essa é uma construção que ainda estou fazendo. Quando se fala, espera-se do outro uma resposta ratificadora daquilo que se disse (e aqui, ratificar não necessariamente quer dizer concordar); a questão está é que esta espera, é do Outro que esperamos, do nosso próprio eu-social. E aí está todo o trabalho do analista, o de não responder dessa posição alienante, mas de Outro lugar.
Quando a resposta que as pessoas esperam não vem, é um vazio que é devolvido... isso tem a ver com a construção de que eu falava: minha resposta sempre foi o silêncio. Hoje em dia, ele não está mais tão presente, o que me coloca em outro problema: como responder sem esperar um envolvimento daquele que fala com o que ele fala? E mais, como não me envolver com o que é dito?
Li alhures que a psicanálise é uma peste. Concordo. Uma vez experimentada, não há como dela sair, não há mais como falar sem nada dizer, não há mais como alienar-se a uma fala vazia. O que se espera é outra coisa, aquilo que se chama um sentido pleno.
Falar é, mais do que tudo, uma relação sexual, naquele ponto de uma relação possível, já que ela inexiste.

3 de jun. de 2010

O Solista

Saber que a vida não tem sentido não é para qualquer um. Para ser poético, é um dom pelo qual se luta constantemente, infindavelmente. Se me expresso melhor, queria mesmo dizer que o dom está em continuar vivendo sob essa ameaça, se assim posso chamar a falta-a-ser. Dói e por isso não se arrisca nem dizer, porque a palavra é ela própria uma ameaça, um prelúdio de ação, que mesmo assim age. Uma vida sem sentido. Parece que era isso que o ávido homem tentava evitar. O medo de perder a sanidade. Medo de se escutar  nessa posição de vazio. "Não vejo a quem culpar", diz Mr. Lopez, o deus. E quem poderia ser o culpado, se o próprio deus não o é? "Não vejo nenhum resultado a esperar, não acredito que valha a pena; cansei de tentar, desisto", complementa ele entre lágrimas. E eu ratifico-lhe a visada. "Não podia parar o terremoto; não pode consertar a cidade; e nunca vai curar Nathaniel", desfere à queima-roupa a ouvinte, que então se fez falante, porta-voz da incompletude na anunciação de nossa mediocridade. Nos resta só-listas: coisas para fazer, coisas que queremos e pelas quais nos enganamos, coisas que somos, sozinhos. Carregar nosso passado a tiracolo, num carrinho de supermercado, sabendo que nada há além de nossas próprias fantasias.
Nota: Filme "O Solista", 2009.