4 de out. de 2015

2 de set. de 2015

Treino de romance ou como nasce um sedutor pedante em 2 tempos

Tempo 1: o horror
No ônibus, um casal de adolescentes está sentado no banco à frente de uma mãe com seu filho de uns dois anos e meio (certamente, menos que três anos). O menino vai quieto até que o casal da frente começa a se beijar e ele fala "éécaaaa! Que beijo estranho! Écaaa, que nojo!", repetindo isso algumas vezes.
Tempo 2: a curiosidade frente ao horror e a repetição
Passados alguns poucos minutos, o menino volta-se à mãe e pede-lhe beijos, ao passo que ela, sem sucesso, tenta se negar, oferecendo as bochechas. A criança não se contenta, claro, e vai beijando todo o rosto da mãe, nomeando os lugares e lambuzando-a de saliva (provavelmente).

31 de ago. de 2015

Um conto para Maurício

Maurício não gosta de intimidade. Maurício é distante, ausente, diferente. Pegar na mão, nem pensar. Acompanhar no teatro nem pensar.
Maurício é muito macho, gosta de futebol, boteco e foder selvagem. Homem como Maurício, só existe ele mesmo. Homem com um culhão a mais.

Maurício não sabe que precisa que lhe falte um dos culhões.

Ah, Maurício, nem te conto. Nem te conto o que penso de você. Não consegue ouvir o vento batendo e fazendo barulho ao passar pela brecha? Mas eu consigo ouvir bem lá no fundinho, o sibilo do seu. Desejar sem saber.
Se não tivesse uma falha aí, meu sopro não encontraria saída em você para se tornar suspiro.

28 de ago. de 2015

Uma pontuação de Valor

"O valor não se dá por si mesmo, senão pelo que se agrega". Acordei com a frase do meu analista latejando do lado direito do meu cérebro. É interessante como certos conteúdos filosóficos e sempre muito óbvios adquirem uma presentificação de efeitos palpáveis no curso de uma análise.
Valor equivale a uma coragem; há sempre o risco do depósito, da responsabilidade que é sua por depositar no objeto algo que é seu. É sempre arriscado não receber de volta, embora o retorno que vem só pode vir na forma de uma falta (a-riscado), pois que um sujeito só pode trocar porque não possui.
Penso agora naquela pessoa angustiada, se debatendo por não querer aceitar que não é completa, evitando desperdiçar seu precioso valor nos objetos. Talvez o medo do retorno da falha, que viria a denunciar a sua própria, é que a paralise. E penso também na minha teimosia em tentar agregar valor lá onde não existe espaço para isso.
Penso, ainda, em muitas outras coisas. Mas já cansei de escrever. O valor deste delírio depositado aqui é o retorno do eco vazio.