20 de ago. de 2017

Coisa curiosa a vida. Você está aí e eu estou aqui. Poderíamos estar juntos, ter feito uma viagem ou só tomado um sorvete. Poderíamos ter brigado, ter sido mais sinceros ou ido comer aquele doce típico. Eu poderia não ter passado meses pensando no que aconteceu, por uma culpa que não sei do que é. E você poderia não ter tido medo de falar a verdade. Teria sido melhor. Ou não. Coisa curiosa a vida das pessoas.

5 de mai. de 2017

Sobre o abandono do objeto e a identificação

No meu casaco preto de lã tem uns pêlos de um animal que não é meu. Eles não estavam há duas semanas atrás, mas já estiveram antes: outro bicho, cores e tamanhos diferentes mas, essencialmente, os mesmo pêlos. Me repeti já tantas vezes nessa sensação de ter me apropriado de partes não minhas, de ter levado embora cacos e restos de outros, que não tenho certeza de quais são os meus pertences. Quero dizer, estes pêlos aqui, que só consigo enxergar em suficiente claridade, pertencem agora a mim? Devo me livrar deles, devolver ao possuidor original, ou só apagar as luzes?

3 de mai. de 2017

A um amor de outono

Menos de 3 dias e, seguramente, 3 noites inteiras. Esse foi o tempo do nosso amor, que prefiro descrever como trágico, embora tenha sido maravilhoso. Depois, uma semana de conversas apaixonadas, declarações, juras e, por fim, vácuo. Te escrevo pra dizer que minha mudança repentina se deve ao fato de que estou eu mesmo mudando e (meu deus!) - como estou confuso - preciso de um tempo. Na verdade, minto; não estou mudando, apenas me enganando. Mas nada disso importa, o que é importante e eu quero que você saiba é que não suportei me ver tão nítido em você, preciso de um oposto para continuar me enganando. Isso e mais o fato de que tenho medo de me machucar; eu sei que parece meio cliché, meu bem...e eu até tentei inventar mais uma nota de rodapé nessa página, te dizendo que tinha medo de machucar você, mas a edição não foi concluída e ficou assim, sem nota mesmo. Eu tenho tantos problemas na minha cabeça e, de alguma forma (a mais louca possível), eles me dão motivo pra continuar essa minha vidinha; disso eu também tenho medo, de ser feliz, mesmo que eu repita muitas vezes que um dia quero ser. O que seria de um homem sem os seus problemas? Meus problemas são os meus culhões. Tenho tanto medo que ele se materializa no meu corpo, você viu. Mas não posso me desnudar tanto, não posso me encontrar tão vulnerável, pois que prefiro viver perdido. Perdido, meu amor, assim como nós. Não me julgue, guarde as coisas boas; é só lá que elas podem ficar, as boas coisas, na lembrança; assim elas se farão sempre presentes, mesmo ausentes.

25 de fev. de 2017

Tenho em mim um ódio dilacerante. Principalmente pelas pessoas que me amam. Tenho ódio porque elas me fazem humana, à medida que me colocam essa miragem de poder conter-se no outro; tenho ódio porque me vejo, de relance, através delas e o que vejo, bem...é mal. Odeio todas as gentes que me fazem sentir a dimensão do desfalecimento, naquele ponto onde não consigo mais suportar porque não me alcanço. Nessas situações, tento colocar nomes que expliquem a aflição, mas não há nomeação no mundo capaz de traduzir aquilo que ultrapassa essa linha, de até onde já fui antes. E nessa fronteira imaginária, entre eu e o outro, existirá sempre um terreno onde nunca poderei pisar.

24 de fev. de 2017

Ramona (réplica)

Você notou como as velhas de coque gris sempre usam grampos de cabelo maiores e mais dourados?
Até hoje nunca encontrei ramonas como aquelas.
Notou que, quando você compra uma caixinha de ramonas, elas vão lentamente desaparecendo? Atrás da cama, embaixo do carpet, dentro da gaveta...cinquentacemmil ramonas, não importa, sempre que precisar de uma, terá que buscar na caixa (se ainda restar alguma).
Acho que comprar ramonas é isso: saber que elas se perderão para sempre. Eventualmente, poderei encontrar alguma, mas que não servirá sozinha.
Tenho pressa de usar coque grisalho e descobrir o segredo de onde encontrar ramonas que não desapareçam.