29 de jan. de 2010

Da Re-petição (e de uma Clara que não fosse de Drummond)

Clara passeava no jardim e tudo era igual ao redor dela: todo dia o mesmo sol, os mesmos passarinhos cantantes, a mesma ironia de viver. Clara reclamava da vida como um cão que reclama seu osso; pensava que tinha direito a mais do que esta a regalava. Não, mais, achava que nada tinha vindo de presente mesmo, então a petição lhe era certa por mérito. Por toda sua vivência atormentara-lhe um sentimento infindo de que aquele corpo que passeava no jardim, aquela voz que saía de uma boca conhecida não era condizente. E tudo o que fizera fora para tentar ser condizente. E nada, até ali, havia adiantado muito: estava no mesmo lugar, não estava? E Clara repetia mentalmente seus desejos, como um mantra capaz de lhe trazer a mudança... o que ela não imaginava é que naquela manhã, quando tombou sobre um arbusto, num acesso lancinante de dor, tudo ainda continuava igual; a única coisa que mudara foi sua pergunta: como me deixei chegar a este ponto?