25 de jan. de 2018

O craquelado e o ser

A dor vai começando em qualquer lugar até chegar nos ossos. Perdoe-me, não é bem que seja em 'qualquer lugar', sei muito bem onde ela começa. Começa lá onde alguma coisa me lembra que um dia fui descolada de um corpo, lá onde fui decepada e colocada para fora. Desde então, tento me grudar pedaço por pedaço, lasca por lasca...e o resultado fica sempre um tanto quanto disforme, como um souvenir de porcelana que caiu e nunca mais pôde ser inteiro, ainda que um hábil e paciente restaurador tenha conseguido fazer um bom trabalho; porém, o resultado é uma réplica e, por mais que seja bem próxima à original, o tempo vai completando o serviço que a queda iniciou.
Se tenho motivos pra me sentir inteira? Claro que sim. Mas é que fica meio difícil quando o craquelado é constituinte. Sorte a minha que os ossos são revestidos por aquela camada que chamamos 'pele', limite frágil entre o parecer e o completo desnudamento do estrago.
E tem dias que até a pele sofre.

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